“Walt nos Bastidores de Mary Poppins” segue essa moda recente de Hollywood em adaptar makin of’s de algumas produções clássicas suas, como aconteceu ano passado com “Hitchcock”. Mas ignore a fraca tradução do título original “Saving Mr. Banks”, pois eis um filme mais do que sobre “Mary Poppins” ou seus bastidores. É uma boa de história de P. L. Travers, criadora da personagem, e sua infância.
Pamela Travers cresceu na Austrália rural, em uma família liderada por um pai fantasioso, exagerado, com dificuldades de assumir uma postura de chefe de família. A escritora, que como toda criança idolatrava seu pai, teve que ver essa figura paternal sumir perante problemas reais que a vida sempre apresenta. Criou Mary Poppins como catarse para essas dificuldades e quando Walt Disney, o icônico produtor dos estúdios que levam seu nome de família, quer adaptar a babá para o cinema, Travers fica reticente.
Mary Poppins é íntima para ela, logo para a criadora fica difícil ver outro criador adaptá-la, mesmo que ele prometa fidelidade. A gente sabe que isso é impossível e pelo jeito ela sabia também! Travers era contra as sequências de animação (e as odiou até o final de sua vida) e era pouco fã das músicas incorporadas a uma história que ela não queria que fosse musical, alegre e divertida. Disney foi insistente – e a gente sabe que ele alcançou o resultado esperado – mas a narrativa deste filme é focada na mulher durona, na P. L. Travers e seus profundos problemas fraternais.

O pai de P. L. Travers é interpretado por Colin Farrell.
A história vai e vem com os bastidores de “Mary Poppins” e a infância da autora. Em alguns momentos é piegas, buscando associar algumas imagens com o passado (o “trauma” dela com peras) ou quando bota Travers para cantar um musical toda feliz (um momento bastante forçado). Mas às vezes o diretor John Lee Hancock surpreende! Ele dirigiu o fraquíssimo e melodramático “Um Sonho Possível”, mas aqui ele foge dessa expectativa açucarada e nos mostra uma personagem sofrida na alma e a razão de suas cicatrizes. Momentos onde as duas linhas do tempo se misturam, com na impactante cena em que os compositores cantam uma cena do filme e Travers se lembra de seu pai bêbado, mexerão com qualquer um.
Se “Walt nos Bastidores de Mary Poppins” tinha tudo para ser piegas, conseguiu não sê-lo. O filme é produzido pela Disney, portanto em sua alma há uma história doce, para toda família, mas a capacidade do roteiro de ir além com certos temas é louvável. Méritos fortes para Emma Thompson, arrasando em sua interpretação da autora fechada e difícil. Em suas nuances e maneirismos, uma criação incrível dessa grande atriz! Tom Hanks encarna Walt Disney, uma figura nunca antes interpretada no cinema – algo surpreendente, considerando sua importância na história de Hollywood. Disney era uma figura complicada e como coadjuvante desta história não é aqui que ele será tratado apropriadamente. Seu racismo, por exemplo, é sumariamente ignorando, mas quem se importa? Apesar do título brasileiro focar na figura de Walt Disney, “Saving Mr. Banks” é sobre P. L. Travers e o Sr. Banks que ela não pôde salvar.

Os verdadeiros Walt Disney e P. L. Travers ao lado de Julie Andrews.
Curiosidade que o filme não deixa claro ao final: Travers acabou não gostando da versão cinematográfica de “Mary Poppins”, a ponto de jamais ceder a Disney direitos pelos seus outros sete livros. Inclusive no seu testamento ela proíbe qualquer outra adaptação de Mary Poppins sendo feita por roteiristas norte-americanos. Ouch!
Reblogged this on Curiosidades na internet.
CurtirCurtir